Como tudo começou?
Para quem não sabe, esse fenômeno não ocorreu apenas no Brasil. Nos anos 70, Chaves e Chapolin foram criados por Roberto Gómez Bolaños, conhecido em seu país como Chespirito - apelido que quer dizer "pequeno Shakespeare", pela sua genialidade como roteirista e pela sua estatura de 1,60m - como quadros de um programa de comédia da televisão mexicana. Com o sucesso imediato, ganhou novos personagens, multiplicou a audiência, e tornou-se o primeiro 'enlatado' latino-americano globalizado da história, sendo exportado para mais de 40 países, chegando a incomodar campeões internacionais de audiência da época como "Feiticeira", "Jeanne é um gênio", "Perdidos no Espaço", "Os Waltons" e outros enlatados americanos.
Em países como Peru, Chile e Venezuela, chegava a dar mais de 60 pontos no horário nobre. Em 1973 o programa de Chespirito era líder de audiência absoluto em quase todos os países da América Latina de língua espanhola. Parou de ser produzido somente em 1995, mas até hoje se mantém um programa muito assistido, mesmo com a grande maioria das emissoras reprisando episódios antigos (no Brasil, Chaves chegou a bater a "Anameba Brega" e seu "MenAs Você" alcançando 15 contra 9 pontos no Ibope, o que obrigou a Globo a dar umas férias forçadas para a mocréia e o Louro Mané e mudá-los para a parte da manhã).
Tornou-se tão popular que chegou a ser homenageado pelo Mattew Groening com um personagem no seriado Os Simpsons: o Homem-Abelha M
O que ele tem que os outros não têm?
Há diversas explicações para o sucesso. Segundo o próprio autor, Chaves é um menino pobre, faminto, que mora num cortiço e que apesar de tudo, não perde o bom-humor e a vontade de se ser feliz. Portanto, em qualquer país onde houver crianças nessas condições, o sucesso será garantido, pois o público identifica facilmente o contexto do seriado com sua própria realidade social. Claro que conta também o fato de ser um programa que exibe um humor ingênuo, simplório e sem nenhum tipo de apelação.
Já o êxito do Chapolin é mais interessante: Chespirito diz que o personagem é o autêntico super-herói latino-americano, fracote, atrapalhado e debochado que faz oposição aos Batmans e Super Homens, personagens inabaláveis e inimputáveis mas que nunca tiveram nada a ver com valores das crianças do hemisfério sul. Além disso, as grandes multinacionais culturais até então obrigavam as emissoras latinas a promover esses heróis que exaltavam as cores de suas bandeiras e o orgulho de ser desenvolvido, civilizado, "americano do norte". Chespirito chega até a alfinetar a virilidade desses heróis americanos, afirmando que ao contrário deles, uma das principais características do Chapolin é que ele gosta muito de mulher e sempre está paquerando descaradamente a mocinha do episódio.
Eis a própria definição de Roberto Gómez Bolaños: "Cervantes escribió El Quijote como una crítica a las novelas de caballería y, salvando las distancias, yo hice el Chapulín como el antihéroe latinoamericano en repuesta a los Batmanes y Supermanes que nos invadían desde el norte." Mais do que isso, Chapolin é, salvo as proporções também, a própria encarnação do anti-herói auto estereotipado, o "Macunaíma mexicano" que carrega consigo de maneira debochada, preguiçosa e "sem caráter" o perfil do 'homem cordial' e o 'espírito aventureiro' do povo latino americano (quem estiver a fim de saber mais a respeito do assunto, leia Sérgio Buarque de Hollanda e suas "Raízes do Brasil").